quarta-feira, 15 de agosto de 2012

Fontes de inspiração verdes

Saiba o que as empresas do sul estão fazendo para tornar os ambientes fabris mais alinhados com conceitos de sustentabilidade

O desperdício é zero Além de instalações bioclimáticas, com uso reduzido de recursos como energia e água, a fábrica do futuro terá todo seu processo produtivo baseado na filosofia do “desperdício zero” – um solo fértil para o exercício da inovação e da criatividade. É o que demonstra o caso da Masisa, que inovou na reutilização de resíduos do processo produtivo – e com tremendo sucesso. Escolhida como um dos 16 campeões da sustentabilidade entre 1,5 mil empresas dos mercados emergentes durante o Fórum Econômico Mundial, realizado em setembro de 2011, na China, a Masisa desenvolveu uma técnica para extrair água da madeira, sua principal matéria-prima.

“Metade da madeira é feita de fibra. A outra metade é água. O que fazemos é extrair essa água por meio de evaporação. Quando o vapor se condensa, a água vinda da madeira está limpa e purificada. Isso nos dá cerca de 6 mil metros cúbicos de água por mês em uma única unidade”, conta Fernando de Geus, gerente de responsabilidade social e ambiental da Masisa.

O cálculo é simples: quanto mais a empresa produz, mais água economiza. Na unidade de Ponta Grossa (PR), a economia é de R$ 3 por metro cúbico de água – R$ 18 mil mensais. A técnica, por sinal, foi desenvolvida pelo braço brasileiro da empresa e depois replicada em uma nova fábrica no Chile.

Outra iniciativa foi a redução do consumo de combustíveis fósseis na fabricação de painéis de MDF. O processo, que exige a aplicação de altas temperaturas para a aglutinação das fibras da madeira, é hoje feito principalmente pela combustão de resíduos da própria madeira usada no MDF – como cascas, tocos e galhos. “A fábrica de Montenegro (RS) já começou as operações com essa planta térmica, que usa 100% de combustível renovável. Em Ponta Grossa, foi uma inovação que fizemos com o carro andando e que custou US$ 4 milhões”, conta Geus. A inovação levou a uma queda de 870 toneladas mensais na emissão de CO2 – e de 60% dos gastos mensais em energia. Além disso, a Masisa é referência internacional em reúso de água.

A água é reciclável

Para economizar no consumo de água, a nova planta da GM em Joinville contará com um complexo sistema chamado “osmose reversa” – que irá gerar até 22 mil metros cúbicos por mês, provendo o consumo de 100% da água não potável na fábrica. “A unidade terá um tanque para acumular água da chuva e outro para o esgoto tratado. As duas fontes abastecerão o sistema de osmose reversa, formado por membranas semipermeáveis, que retêm os resíduos sólidos, os micro-organismos e os químicos. Isso gera uma água de excelente qualidade para uso industrial, sanitários, jardinagem e lavagem de pisos, por exemplo”, diz Claudia Pires. “Apenas 19% da água utilizada virá da rede de abastecimento. Serão 22 milhões de litros de água reciclada por ano.”

A unidade da Keko em Flores da Cunha irá ainda mais longe: tratará 100% dos efluentes por meio de dois sistemas. Um deles purifica a água usada em sanitários e restaurantes, e o outro, os efluentes industriais. Após um processo de cloração, a água passa por um teste de toxicidade e volta ao processo produtivo, aos sanitários, aos banheiros. Além disso, serve para encher o espelho d’água que enfeita os jardins da unidade. “Toda a água é tratada, inclusive os químicos, as tintas”, explica Juliano Mantovani, diretor de mercados, inovação e qualidade da Keko. “Só não pode ser bebida porque teria de passar por um processo de filtragem. Calculamos que nossa economia será de 500 mil litros por mês.”

Reúso de água é uma das especialidades da Masisa, que há dez anos recicla tudo o que usa em sua unidade de Ponta Grossa. A unidade de Montenegro, inaugurada em 2010, conta com mais uma benesse: uma série de lagoas artificiais usadas para captação de água da chuva. A bacia de contenção tem capacidade de 170 mil metros cúbicos, o equivalente a três campos de futebol, e garante a água necessária aos processos produtivos mesmo em períodos de estiagem.

A energia é limpa
A PepsiCo é outra companhia que apostou na reutilização de resíduos para economizar no processo produtivo. “Em nossa fábrica de produtos Quaker, em Porto Alegre, substituímos a caldeira a vapor, movida a gás natural, por uma caldeira que utiliza como combustível a casca da aveia – até então, um resíduo industrial”, explica Cláudia Pires, gerente de sustentabilidade e responsabilidade social da PepsiCo no Brasil.

Por mês, 1,4 mil tonelada de casca de aveia geram energia – diminuindo em 20% o volume de resíduos. A medida reduziu à metade o consumo de energia por quilo de aveia industrializada. A solução, por sinal, foi desenvolvida por uma empresa gaúcha, a APS Engenharia de Energia – que, por cinco anos, ficará responsável pela operação do sistema.

O lixo é coisa do passado
Além de transformar casca de aveia em energia, a PepsiCo aposta na reutilização dos restos de plásticos. Isso graças a uma inovação projetada pela Wise Waste, empresa especializada em analisar os resíduos de uma empresa e descobrir formas de transformá-los em produtos. “No caso da PepsiCo, desenvolvemos uma forma de transformar sacos de salgadinhos em pallets de plástico”, conta Guilherme Brammer, sócio da Wise Waste. Pallets são estrados, geralmente feitos de madeira, para transportes de cargas em viagens. “Esses sacos iriam parar em lixões, mas nós os recolhemos e levamos de volta ao gerador. O custo de um pallet de plástico é mais alto que o de madeira, mas a diferença se paga em uma ou duas viagens. Tão logo se quebra, o pallet de plástico é reciclado outra vez.”

Outro exemplo da reutilização de plásticos é o da Braskem, a maior fabricante de resinas termoplásticas das Américas. A iniciativa sustentável da empresa é transformar lixo em luxo – na forma de mobílias politicamente corretas. Durante a Rio+20, a empresa colocará em funcionamento uma usina de reciclagem que vai transformar resíduos plásticos em cadeiras, mesas, bancos, floreiras e outros móveis – tudo feito de madeira plástica. A iniciativa, tocada em conjunto com a empresa de engenharia ambiental Cetrel, tem o objetivo de mostrar que o plástico não precisa acabar em lixões a céu aberto ou entupindo bueiros.

Na nova unidade da Keko, a filosofia do lixo zero inclui toda uma mudança na cultura dos funcionários. “Quando a fábrica estava sendo construída, trazíamos grupos de 30 ou 40 funcionários para explicar conceitos como reutilização de resíduos e economia de energia. Hoje, eles levam esses conceitos para suas casas”, conta Juliano Mantovani. Os funcionários aprenderam, entre outras coisas, a fazer a coleta seletiva dos resíduos. O controle é feito através de planilhas encaminhadas periodicamente para a Fundação Estadual de Proteção Ambiental do Rio Grande do Sul, a Fepam. O lixo reciclável é encaminhado para empresas recicladoras, e os demais, para empresas licenciadas a fazer o descarte adequado. Os resíduos orgânicos do restaurante são transformados em adubo. A medida também é utilizada em todas as unidades da GM, que em 2010 transformou cerca de 700 toneladas de resíduos de alimentos em adubo orgânico.

A vez da arquitetura climática
Entre outros pontos em comum, as novas plantas da GM e da Keko apostam nos benefícios da arquitetura bioclimática. No caso da Keko, há dois prédios inteiros sem paredes de concretos – são feitas inteiramente de vidro. Isso leva a um aproveitamento máximo da luminosidade natural. Quando há excesso de sol, uma série de dispositivos chamados brises-soleil controlam o excesso de luz. Nos outros prédios, há um sistema de placas prismáticas – pequenos prismas em formato cônico, de três a quatro metros de largura, que não geram energia, mas multiplicam a luz solar, iluminando o interior do prédio. Todas essas medidas diminuem o consumo de energia em até 30%. “Raramente acendemos a luz elétrica na fábrica. Só em dias escuros ou de chuva”, garante Juliano Mantovani.

A planta da GM também terá iluminação natural. Os prédios contarão com sensores de luz e dimmers – dispositivos utilizados para graduar a intensidade da corrente elétrica. “De dia, a luz do sol é suficiente para iluminar os ambientes. Quando começa a escurecer, o sensor detecta a diminuição da luz natural e o dimmer aciona a luz elétrica na medida necessária”, conta Claudia Pires. Além disso, haverá sensores de presença humana – quando não houver ninguém na sala, a luz se apagará automaticamente.

Os prédios da Keko contarão, ainda, com paredes duplas, que fazem um melhor acondicionamento térmico. As paredes são formadas por chapas de lã de vidro com 10 cm, que impedem a entrada do calor ou do frio. Além disso, há um espaçamento entre as paredes e as telhas, permitindo a circulação do ar, que sai por um duto no vão central do prédio. Isso faz com que todo o ar no interior da construção seja trocado de quatro a cinco vezes por hora. “É mais caro que um conjunto de paredes normais, mas dá um ganho enorme de produtividade. Se na rua estiver fazendo 30 graus, aqui dentro faz 26 sem ligarmos o ar-condicionado. No inverno, o interior da fábrica fica uns quatro graus mais quente do que a rua”, explica Mantovani. Além disso, os prédios são cercados por uma área verde de preservação natural de 3 mil metros quadrados, incluindo árvores de espécies nativas e dois rios – ainda mais sombra e água fresca, aumentando o conforto climático e a qualidade de vida dos funcionários.

Fonte: Amanhã.

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